Alopecia
“Para desentristecer, leãozinho
O meu coração tão só
Basta eu encontrar você no caminho”
Na escola, havia uma garotinha cuja ternura a fazia sobressair-se aos seus pares — o que, em termos de escola pública, muitas vezes se traduz em um ato imperdoável.
Era negra e ostentava um suntuoso black power. A execrabilidade que se seguia era daquelas que expõem os dispositivos mais ou menos inconscientes que (nós) racistas (se você ainda acha que crianças não o podem ser, bem…) lançam mão a fim de lidar com seus recalques. Moleques entoando a mais doce das canções — Leãozinho, do Caetano — mas com o espírito da troça. Que poder tem o Homem para erguer e destruir coisas belas…
A calvície deveria forçar todo homem a repensar suas convicções sobre cabelos. Com efeito, sobre beleza no geral. A misoginia sempre foi, inclusive, cafona; do design de cadeiras àquelas fotos já tão caricatas em redes sociais de machões em suas caminhonetes, com bonés e óculos de sol.
Gostaria de escrever para a Leoazinha e dizer que sinto muito por todos aqueles garotos imbecis que não compreendiam sua graça e encanto. Entrego minha fé às filhas do sol: que, lá atrás, elas possam ter te acolhido, para que você realize sua sina de fera que nutre a prole e rasga gargantas de caçadores.