Odeio viajar
(Dedicado a todos os seres amados que, por minha culpa, já tiveram que digerir nos ouvidos a epiderme amarga destas palavras).
Não concebo o tempo da viagem. Justamente quando compreendo as curvas das ruas, dos ventos e dos olhares, ele se esvai. É sabido que a aceleração é o pior inimigo da insegurança; contudo, sou também partidário do devagarinho, de modo que a velocidade da viagem, acima de tudo, me ofende. Não poder viver o Lugar-Outro é uma violência porque espaços reivindicam alteridade e, para tal, é necessário carinho — que opera de outros modos pois exige remanso e cuidado.
Ao me preparar, pensei em colocar um caderninho de anotações na mala — sou desses que guardam vários blocos de notas com comentários e anotações desenraizadas — porém me lembrei das experiências pregressas, onde raramente houve tempo para o momento, e me entreguei à vulnerabilidade que é caminhar sem colonizar palavras.
Mesmo assim, me vilipendiei ao dizer que trouxera o tal. Por algum motivo, mesmo que convicto da justeza de meu protesto, ainda me culpo por não consumir, mas me parece impossível assumir integralmente tal postura pois a locomoção me arrebata para além do movimento: sobretudo, como suspensão. Com efeito, creio que é somente lá — e não aqui — que a vida e as coisas podem ser verdadeiramente contempladas.
Aproveito o ensejo-agressão que é o retorno ao ethos capitalo-urbano e resumo o sentimento — afinal, aqui, tempo é dinheiro. Para além — ou a despeito — do que foi dito anteriormente, assumo que o maior problema de toda viagem é tão somente o óbvio, sua essência absolutamente intrínseca:
Sempre acabar.